A primeira coisa que me chamou a atenção no documentário "Juízo" foi a cor dos jovens infratores. A maioria eram pretos, isso não passa despercebido por mim. No mundo em que vivemos a questão racial está em tudo.
A obra da cineasta Maria Augusta Ramos, substitui o rosto dos personagens reais, que por serem menores de idade não podem aparecer, por atores mirins oriundos das comunidades. Esse recurso humaniza e choca ao mesmo tempo. São crianças vindas de lugares semelhantes, aqueles que estão em frente a tela sabem que poderiam estar atrás das grades.
O longa metragem acompanha a realidade dos menores acusados de crimes, que vão de roubos fúteis até assassinato. O julgamento, o dia a dia e os olhares perdidos daqueles que nunca vou poder desfrutar a infância e adolescência, são uma trama eletrizante de uma sociedade totalmente doente.
Meninas e meninos com famílias desestruturadas escolhem um caminho tortuoso, provavelmente não vão encontrar outra realidade. Em um dos casos, uma jovem acusada de furto recebeu o perdão do Ministério Público e relutou para aceitar. "Voltar para casa é pior."
As histórias das acusações são relatadas em uma sala, com uma juíza gritando com tom passivo/agressivo os atos. Em um momento, o adolescente assustado entra na sala, com os olhos cheio de lágrimas para reviver a noite que matou o próprio pai a facadas, depois de uma vida de surras e um abandono. Um trauma emocional que se transformou em uma marca para sempre.
Batendo quase 1h30, uma das últimas cenas apresenta uma conversa quase cômica, porém trágica. Um rapaz de 20 poucos anos cumpria seu tempo e ganhou o benefício de liberdade assistida, mas não entendeu o linguajar do juiz, não sabia o que significava L.A e fugiu da instituição, voltou tempos depois para descobrir que estava livre. Isso só comprova a profundidade do descaso com aqueles que estão á margem.
Em resumo o filme dispensa narrações, a realidade já é cruel o suficiente. Jovens pobres, em sua maioria pretos, jogados ao azar, brincando com o poder das ruas, ferindo as leis, mas com medo, ainda agarrados ao colo de mãe no dia de visita. Criados pelo mundo, se tornam os vilões, são punidos e quando podem desfrutar a liberdade só conhecem o ódio. O "Juízo" é mais uma prova que o mundo tem os seus favoritos e que punir é ponta do iceberg.
Para conferir na íntegra, o filme está disponível na plataforma Netflix e YouTube é possível encontrar o trailer: https://www.youtube.com/watch?v=OFIChJPrL4g.
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